O chão de terra é tão sujo e poeirento que não se acha digno
da pureza cristalina das gotas de chuva. Mas, mesmo assim, sonha com ela. Às
vezes chega a sentir o cheiro dela. Vê, lá no alto, o vento levando as nuvens
para lá e para cá. Mas nenhuma gota cai na terra seca. Ah como seria se a chuva
pudesse descer de tão longe, vir de tão alto para brincar com a terra?
A terra tem vontade de encontrar com a chuva. De tão ansiosa
e com a ajuda do vento, procura subir aos ares e quem sabe alcançar as nuvens e
pedir um carinho da chuva.
E desse jeito, no cerrado passam-se dias e noites e nada de chuva. O sol quente e a
lua silenciosa passam e a terra somente espera. Nem chorar a terra pode, porque
até o choro é chuva.
Uma vez a terra pôde perceber no vento que a chuva esteve
ali por perto, mas foi embora. Chegou até escutar os trovões, que só apertaram
a saudade. E com a seca, tudo vai diminuindo, menos a esperança. Seria menos
doloroso se a esperança aprendesse a minguar também.
É noite de lua cheia. A noite é o silêncio onde todos
dormem. A terra vermelha, com seus olhos secos, olha o céu. Espera, esfacelada em
poeiras. Madrugada adentro, de vez em quando, aqui e ali, passam leves sopros
do vento, que vem pé ante pé, mexer em alguns galhos secos, mas logo tudo torna
a ser silêncio.
E, mesmo com todos dormindo, a terra, como em sonho, vê uma
imagem que, aos poucos vai se convertendo num grande vestido, sorrateiro, correndo
com inacreditável barulho por entre as folhas secas e galhos pontiagudos, que
vão rasgando pedaços do pano e deixando fiapos por todos os lados.
É a chuva, com pés descalços, dançando sorridente na poeira. Sujando seus pés cristalinos com poeira. Milhares de pés. Milhões. Ela vem cantando alto, com a voz mais bonita que existe, espalhando sorrisos que reluzem na noite, como relâmpagos.
Vem batendo palmas de trovões, divertindo-se, segurando seu vestido branco, correndo morro abaixo, subindo em cima das árvores, abraçando os telhados. E finalmente, beijando com sensualidade a terra feliz, que vai virando barro. Então naquela madrugada a chuva dormiu tranquila e mansinha, protegida sobre o peito da terra bruta, que chorou de alegria.
É a chuva, com pés descalços, dançando sorridente na poeira. Sujando seus pés cristalinos com poeira. Milhares de pés. Milhões. Ela vem cantando alto, com a voz mais bonita que existe, espalhando sorrisos que reluzem na noite, como relâmpagos.
Vem batendo palmas de trovões, divertindo-se, segurando seu vestido branco, correndo morro abaixo, subindo em cima das árvores, abraçando os telhados. E finalmente, beijando com sensualidade a terra feliz, que vai virando barro. Então naquela madrugada a chuva dormiu tranquila e mansinha, protegida sobre o peito da terra bruta, que chorou de alegria.
A chuva passou, deixou marcas e alimentou sementes que agora
a terra terá que abrigar e cuidar.
É por isso que na lua cheia de maio dá pra ouvir o chão do
cerrado uivando para a chuva, que parece ter se esquecido da terra e finge não
ouvir o seu surdo lamento.
Ela passa ao largo, flerta com o sol, esconde a lua, brinca com o vento e às vezes até espalha o seu perfume, mas faz pouco caso com a terra estiada. Ao ouvir esse lamento surdo da terra, mesmo nos meses mais secos, em todas as manhãs o cerrado lança à terra o orvalho, na tentativa de reduzir a sua saudade da chuva.
Ela passa ao largo, flerta com o sol, esconde a lua, brinca com o vento e às vezes até espalha o seu perfume, mas faz pouco caso com a terra estiada. Ao ouvir esse lamento surdo da terra, mesmo nos meses mais secos, em todas as manhãs o cerrado lança à terra o orvalho, na tentativa de reduzir a sua saudade da chuva.